O território

O território

Territórios dos Kayapó Mekrãgnotí

Bloco das Terras Indígenas Kayapó

 

Os Kayapó  Mekrãgnotí ocupam as Terras Indígenas Baú e Menkragnoti, situadas no oeste do bloco de TIs Kayapó, ao norte do Mato Grosso e sul do Pará, numa área de 6,5 milhões de hectares.

 

A  área tradicional de ocupação dos indígenas fica entre os rios Xingu e Tapajós, descendo até a margem direita do rio Jamanxim, nas proximidades do que hoje é a cidade de Novo Progresso, no Pará.

 

O extinto Serviço de Proteção ao Índio (SPI) iniciou o contato com os Kayapó há pouco mais de 70 anos, após relatos de conflitos com seringueiros, que subiam o rio Xingu para se fixar na bacia. Uma década após o contato, doenças haviam dizimado os Mekrãgnoti. Em 1967, epidemias de gripe e sarampo mataram 30% da população original.

 

A partir de 1971 foi iniciada a construção da rodovia BR-163, rasgando a floresta da capital matogrossense (Cuiabá) a Santarém. A obra era parte do Plano de Integração Nacional implantado pela ditadura militar. Sob o lema “Integrar para não Entregar” o objetivo era  ocupar a Amazônia, ignorando a presença de indígenas na região. Os Kayapó Mekrãgnotí, assim como os Panará, estavam no caminho.

Desmatamento no entorno das TIs Baú e Menkrâgnoti

Os Panará tiveram seu território partido e foram expostos a doenças, álcool e prostituição. Com a população reduzida a 85 sobreviventes, foram removidos para o Parque Indígena do Xingu e  só conseguiram retornar quase 20 anos depois.  Mais numerosos e combativos, os Kayapó resistiram. Mesmo assim, em 1976, ano em que a BR-163 foi inaugurada, só  20% da população original da Terra Indígena Baú havia sobrevivido.

 

TI Baú

 

Se a BR-163 roubou dos Kayapó o acesso ao rio Jamanxim – ainda hoje presente nas histórias contadas pelos anciãos – posseiros, madeireiros e garimpeiros que chegaram com a estrada conseguiram tirar deles uma área de 300 mil hectares em meio à luta pela demarcação.

 

Em 1991, a TI Baú foi declarada de posse indígena, com 1,85 milhão de hectares no sul do município de Altamira e no município de Novo Progresso. Invasores apoiados por políticos locais impediram várias vezes a demarcação física com agressões aos Kayapó e a funcionários da Fundação Nacional do Índio (Funai).

Em 2003, quando a demarcação foi retomada e os conflitos se acirraram, os Mekrãgnotí aceitaram abrir mão de uma faixa equivalente a 3 mil km² no lado oeste da TI Baú, em troca da promessa de fim das invasões. Um termo de conciliação e ajustamento de conduta foi firmado entre Ministério Público Federal (MPF) de Santarém, Funai, Polícia Federal, Prefeitura de Novo Progresso, lideranças Kayapó, associações de fazendeiros, posseiros e garimpeiros.Com base neste acordo, a TI Baú foi reduzida para 1.543.460 hectares naquele ano. A homologação só aconteceu cinco anos depois, em 2008.

 

TI Menkragnoti

Com   4.914.254 hectares, a TI Menkragnoti está localizada em partes dos municípios matogrossenses de Matupá e Peixoto de Azevedo e nos paraenses de Altamira e São Félix do Xingu e foi homologada pelo presidente Itamar Franco, em agosto de 1993.

Um  parecer de maio de 1993 da consultoria jurídica do Ministério da Justiça recomendando a homologação afirmava que os Kayapó estavam sendo “exterminados”. Citava uma liminar concedida pela justiça em Altamira determinando a retirada de operações de madeireiros dentro da Terra Indígena e informações de que uma madeireira que respondia na época a  inquérito policial, havia retirado após a liminar 60 caminhões carregados de mogno de uma área no município de Trairão, no Pará, disputada entre indígenas e um projeto de desenvolvimento regional licitado pelo governo paraense e suspenso pela Funai.

Na época, o parecer já chamava atenção para a repercussão internacional negativa, mencionando uma matéria publicada pelo jornal Correio Braziliense, de fevereiro daquele ano  relatando uma reunião promovida pela Federação do Comércio Madeireiro de Londres (Timber Trade Federation) com ambientalistas, importadores e representantes de órgãos do governo britânico “para condenar a importação de mogno extraído, principalmente, de reservas indígenas, dispondo-se a iniciar intensa campanha de proteção das reservas tropicais”. O decreto de homologação deixou a área em disputa para os proprietários privados.

O assédio dos madeireiros e o roubo de madeira da TI Mekrãgnotí só foi controlado com a instalação de bases de vigilância nos ramais (estradas vicinais) de acesso à TI. As bases são financiados com doações e fazem parte de um projeto conjunto do Instituto Kabu, Associação Floresta Protegida e Instituto Raoni, que também têm aldeias associadas na TI Mekrãgnoti e instalaram postos fixos e volantes em outras TIs do bloco Kayapó.

Outra fonte de pressão na TI é a soja, cuja expansão para o norte já chegou aos limites do território indígena. Durante a época de chuvas, os agrotóxicos chegam aos os rios e os indígenas se queixam de coceiras e alergias.

 

Aumento das pressões

Desde 2010, o Instituto Kabu dos Kayapó Mekrãgnoti monitora o desmatamento no entorno e dentro das TIs. Apesar de terem aberto mão de uma área do tamanho da Bélgica para terem seus territórios respeitados e do problema ter sido controlado com intensificação da fiscalização do Ibama entre e 2018, a partir de 2019, as pressões se ampliaram. Naquele ano, houve o Dia do Fogo em Novo Progresso e em 2020 as invasões no lado oeste, voltado para a BR-163, que foram relativamente poucas ao longo dos últimos 10 anos, tiveram um aumento significativo em 2020 e atingem as duas TIs.

Garimpos desativados dentro e fora da Terra Indígena Baú voltaram a operar nos últimos dois anos, desta vez com grandes dragas em barcaças, que revolvem a lama do fundo dos rios, tornando a água turva e contaminando os peixes consumidos pelos indígenas. Em 2018, a Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), analisou a concentração de mercúrio nos peixes e tracajás (espécie de tartarugas) nos rios Baú e Curuá dentro da TI Baú. Encontrou mercúrio em todas as espécies mais consumidas e concluiu que os indígenas estavam ingerindo mercúrio em quantidades muito superiores aos limites considerados seguros pela Organização Mundial da Saúde. Os peixes são a principal fonte de proteína na alimentação dos Kayapó.

O próprio Instituto Kabu está sob ataque da Funai, cujo atual presidente recebeu lideranças Mekrãgnoti do IK, juntamente com lideranças Panará apenas uma vez desde que assumiu e e mesmo assim, sob forte aparato policial. O então ministro da Justiça, Sergio Moro, autorizou a convocação da Força Nacional para dar segurança ao prédio da Fundação Nacional do Índio, em Brasília, na data da visita.

Desde 2019, o IK tem sido estrangulado financeiramente com atrasos de até 11 meses nos repasses, que inviabilizaram projetos como construção de casas de farinha e de depósitos de castanha. Aos atrasos, se seguiu a paralisação do Componente Indígena do Plano Básico Ambiental da BR-163.

Paralelamente, o assédio de madeireiros e garimpeiros sobre os indígenas aumentou exponencialmente. Em 2019, três aldeias da TI Baú se desfiliaram do Instituto Kabu para se associarem a garimpeiros, confiando na promessa de legalização por parte do governo federal e alegando que garimpos fora dos limites da TI já estavam contaminando os rios.

Indígenas Kayapó recebidos pela Força Nacional na sede da Funai, em março de 2020. Eles queriam uma previsão sobre a renovação do CI-PBA.