Proposta 2020-2024

Proposta 2020-2024

O Componente Indígena do PBA, que demorou 30 anos para garantir o direito dos indígenas em obter financiamento para mitigar os impactos negativos trazidos pela rodovia, começou a ser negado em 2019 e foi descontinuado em 2020. Mesmo que DNIT e Funai quisessem renovar o PBA e acordar um Plano de Trabalho, isto não é mais possível desde o final de 2020, quando a Funai formalmente informou ao DNIT sua falta de interesse em renovar um convênio entre as duas instituições que permitia o repasse dos recursos para a implementação para a Funai e sua responsabilidade de fiscalizar a implementação pelo Instituto Kabu, também firmada em convênio com vencimento no final de 2020.

A proposta elaborada pelo Instituto Kabu para o ciclo 2020-2024, amplamente discutida nas aldeias, foi entregue à Funai em março de 2020 para envio ao DNIT. A orientação de técnicos da Funai, que auxiliam o DNIT no processo de licenciamento, foi de que aquele era um material “bruto” que poderia ser discutido e modificado e que seria a base para um Plano de Trabalho.

O órgão, no entanto, enviou um ofício para a Funai cobrando avaliações de ações já realizadas e questionando custos. De acordo com o ofício enviado em meados de 2019, quando a negociação para a renovação já deveria estar em andamento, o ofício do DNIT afirmava que os impactos advindos da rodovia estavam “mitigados a quase totalidade” e concluía que “o rol de ações necessárias deve ser cada vez menor”, apesar do aumento do desmatamento no entorno das TIs diretamente ligado à rodovia, do aumento do garimpo ilegal e da intensa ação de madeireiros ilegais na região. Naquele ano, em 10 de agosto, uma ação coordenada aumentou os focos de calor no município de Novo Progresso em 300% em 24 horas, no que ficaria conhecido como “Dia do Fogo”.

Uma informação técnica da Funai anexada ao processo em julho de 2020 e ignorada pela direção da Funai, rebatia: “Caso exista discordância do DNIT acerca dos impactos junto aos povos e terras indígenas advindos da rodovia, deve ser apresentada a comprovação de que os impactos inicialmente identificados no EIA (Estudo de Impacto Ambiental) elaborado pelo DNIT foram efetivamente controlados, mitigados ou compensados. Tal peça técnica será avaliada pelo Ibama e Funai, no que concerne ao componente indígena”. E completa que “em relação aos custos do PBA-CI, a Funai não avalia tais custos, uma vez que é avaliada a pertinência e eficácia das medidas propostas. Assim, a argumentação acerca do valor contido na proposta inicial do Instituto Kabu é inócua. Resta claro, porém, que não houve qualquer diálogo do DNIT com os indígenas para a discussão acerca da proposta apresentada”.

De fato, entre o primeiro ciclo (2010-2014) e o segundo (2015 e 2019) do PBAI o total de recursos foi triplicado e passou de R$ 7,3 milhões para R$ 22,8 milhões, com a implementação do IK elogiada pela Funai.

A Informação Técnica afirma ainda que em novembro de 2019, em reunião no Ministério da Infraestrutura, a Funai apresentou um balanço geral e a verificação dos principais impactos identificados juntos aos povos e terras indígenas, que são os objetivos das ações do PBA e concluiu que:

  • Os impactos previstos no EIA foram confirmados;
  • A capacidade de resposta das ações previstas é inferior à evolução dos impactos;
  • A gestão técnica qualificada tem sido um diferencial; há uma orientação técnica do processo (responsabilidades das partes, etc.);
  • A capacidade de monitoramento e análise do Instituto Kabu é maior que a do poder público;
  • Há necessidade de melhoria da gestão e execução das ações da Funai, que estão abaixo de 30% de sua capacidade; (em referência ao PBA da etnia Panará, executado pela Funai).
  • As ações de responsabilidade do DNIT têm execução abaixo do esperado;
  • Há novos focos de ameaça advindos do eixo da BR 163 (desmatamento e pressão fundiária).

O informe recomenda a atualização de ações considerando o aumento da população e a dinâmica de ocupação do território, além de diálogo com as comunidades em relação à renovação do PBA e a concessão da rodovia, além da finalização de ações pendentes.

Na análise técnica da Funai, dos seis subprogramas do PBA, o único não satisfatório é o de responsabilidade do DNIT, relativo à abertura e manutenção de ramais.

A resposta da direção da Funai ao ofício do DNIT foi apoiar e ampliar as considerações rechaçadas pela informação técnica, incluindo a sugestão de acabar com alguns subprogramas, como o de documentação, sem nenhuma justificativa. Como a transmissão de conhecimento Kayapó é essencialmente oral, os registros em vídeos e fotos da implementação do PBA por si só mostram sua importância como registro histórico para os indígenas e para a sociedade.

Enviada por e-mail, a proposta de cronograma para a negociação do terceiro ciclo aconteceu apenas durante o protesto dos Kayapó que fechou a BR-163 por 10 dias, em agosto de 2020. E foi rasgada por lideranças no meio da estrada.

Após o protesto, Funai e DNIT fizeram uma reunião com os Mekrãgnotí em Brasília pedindo expressamente o não-comparecimento de técnicos não-indígenas. E apresentaram um documento de três páginas como alternativa ao PBA apresentado pelos indígenas. Sem detalhamento, o documento menciona a construção de uma agroindústria de beneficiamento sem consulta aos indígenas e descolada da realidade local. Isto depois de ter solicitado e recebido justificativas e detalhamentos de gastos passados em um documento com mais de 100 páginas, enviado pelo Instituto Kabu.

Proposta de PBA apresentada pelo Instituto Kabu à Funai e DNIT ficou no papel