Acampamento Luta pela Vida torna-se permanente e abre primavera indígena

Cerca de mil indígenas decidem permanecer em Brasília indefinidamente para acompanhar votação do marco temporal no Supremo
Acampamento Luta pela Vida torna-se permanente e abre primavera indígena
01.09

“Estão tentando nos cansar” desabafou Mydjere Kayapó, vice-presidente do Kabu, após o quarto adiamento do julgamento sobre o marco temporal no Supremo Tribunal Federal (STF), iniciado na quarta-feira (25) e retomado neste dia 1º de setembro. Para acompanhar a votação da semana passada, a maior mobilização indígena desde a Constituinte trouxe mais de 6 mil indígenas de todo o país à Brasilia, no acampamento Luta pela Vida.

O julgamento sobre terras do povo Xokleng em Santa Catarina é fruto de um processo de mais de 20 anos e terá repercussão geral. Se aprovada a tese do marco temporal – exigindo posse indígena sobre  territórios tradicionais em 1988, data de promulgação da Constituição, povos expulsos deixam de poder tentar retornar, dezenas de demarcações podem ser interrompidas definitivamente e até terras já demarcadas podem passar a ser questionadas. Como até aquela data os indígenas eram tutelados, se estivessem fora de seus territórios, não podiam mover ações por conta própria e não poderiam estar em litígio.

Em plenária no último sábado (28), os participantes do  acampamento decidiram manter a mobilização de forma permanente, já que há ainda outras ameaças da agenda anti-indígena à espera de votação no Congresso. Os Kayapó e indígenas de mais de 170 etnias chegaram em Brasília no dia 22 e partiram no dia 29, após uma semana de manifestações, marchas e vigílias. O agosto indígena transformou-se agora em Primavera Indígena. Os participantes, como Mydgere, que afirma “não vão conseguir. Vamos continuar lutando e nos unir”. No próximo dia 07, 35 mulheres Kayapó Mekrãgnoti chegam à Brasília para a Marcha das Mulheres Indígenas e irão se juntar aos cerca de mil indígenas que permaneceram no acampamento.

Em carta publicada no último sábado (28), o Movimento Indígena reafirma “confiamos que a Suprema Corte irá sacramentar o nosso direito originário à terra, que independe de uma data específica de comprovação da ocupação, conforme defendem os invasores”. Amparados na ancestralidade e “pelo poder dos nossos povos, da nossa espiritualidade e da força dos nossos encantados que prezam pelo Bem Viver, nosso e da humanidade, dizemos não ao Marco Temporal”.

Os participantes do novo acampamento, no Eixo Monumental, próximo à Funarte e ao Memorial do Índio, seguiram em marcha nesta quarta-feira (01) até o Supremo Tribunal Federal para acompanhar o reinício do julgamento, que está ouvindo quase 40 representantes dos Amigos da Corte (amici curiae).

“A nossa história não começou em 1988, e as nossas lutas são seculares, isto é, persistem desde que os portugueses e sucessivos invasores europeus aportaram nestas terras para se apossar dos nossos territórios e suas riquezas”, assegura o Movimento Indígena na carta aberta. Também, asseguram seguir “resistindo, reivindicando respeito pelo nosso modo de ver, ser, pensar, sentir e agir no mundo”